domingo, 4 de novembro de 2012

Consciência de Cristo


...”escreveram essas experiências para que servissem de flecha que aponta a salvação, a verdade, mas no momento em que eles a conheceram ficaram conscientes deste conhecer a Verdade...”
Muitos foram os santos que escreveram um itinerário da busca da santidade. Gravaram no papel suas experiências, seus encontros com Cristo, o caminho percorrido para que outros pudessem imitar o mesmo caminho.
O encontro pessoal em vista do autoconhecimento é um propósito de olhar o íntimo com tudo que o há, sejam as virtudes ou os defeitos, e buscar configurar-se a Cristo. O configurar-se a Cristo é imitar seus gestos de amor, é idealizar o encontro da amada com o amado:
Oh! Noite que guiaste,
Oh! Noite mais amável que a alvorada;
Oh! Noite que juntaste,
Amado com amada,
Amada já no Amado transformada!
Das Canções de São João da Cruz
Seus escritos não são vencidos, nem mesmo possuem prazo de validade, pois, se fosse assim, poderia jogar fora os livros espirituais, filosóficos, teológicos, constitucionais e tantos outros. Também não podem ser considerados para aquele tempo. Claro que o seu auge foi naquele tempo, mas ainda podem clarear o caminho de muitos.
Para melhor explicação utilizarei apenas do prólogo da “Subida do Monte Carmelo” de São João da Cruz. “As ditosas almas destinadas a chegar a este estado de perfeição devem, de ordinário, afrontar travas tão profundas, suportar sofrimentos físicos e morais tão dolorosos, que a inteligência humana é incapaz de compreendê-los e a palavra de exprimi-los. Somente aquele que passa por isso saberá senti-lo, sem, todavia, poder defini-lo.” Chamaria isso de vivência do amor com Deus.
A alma que percorre o caminho de subida do monte tem em vista o “estado de perfeição” ou de “união da alma com Deus”. Percorrer o caminho traçado por João da Cruz não significa ter os mesmos sentimentos, a mesma fé. Uns caminham a passos largos outros engatinham. Faça o exercício de acompanhar três pessoas no retorno para casa e saberás que percorrem caminhos diferentes, com paradas estratégicas, que podem cair.
...”Apoiar-me-ei na Sagrada Escritura: tomando-a por guia, não há perigo de engano, pois nela fala o Espírito Santo.” Realmente, ter a Palavra de Deus como luz é falar a Cristo: Tu és o meu caminho, a minha verdade e luz. É confiar em Deus e São João da Cruz bem soube fazer: “Se me decido a este trabalho, não é por crer-me capaz de tratar de assunto tão árduo, mas confiando em que o Senhor me ajudará a dizer alguma coisa, para proveito de grande número de almas muito necessitadas”. Note que ele recebe de Deus a capacidade der ser sensível com as pessoas, isso por ser sensível antes a Deus.
A subida do monte exige ânimo, renúncias, desapegos, deixar-se guiar por Deus e por guia espiritual que já tendo subido ao monte desce para orientar. Entregando sua vontade a de Deus e não impondo limites, dando passos de um adulto maduro e decidido e não de uma criança mimada.
São João quer ensinar “a alma a deixar-se conduzir pelo Espírito de Deus”, pois ele tem consciência de que podemos ser “faltos de luz” e ainda ser orientado por confessores e guias espirituais “faltos de luz e experiência nestes caminhos” conduzindo a alma ao prejuízo. “E doloroso para a alma não se compreender e não achar quem a compreenda nestes tempos de depressão”.
Existem pessoas que são flechas que apontam para Cristo e outras que apontam para o inferno. Claro que a alma sem muita orientação pode acabar caindo em caminhos bonitos que aparentam ser santificantes, mas são falsos, pois enganam e apontam para o tropeço e a queda.
A subida do monte Carmelo, conduz à noite escura, para chegar à perfeita união com Deus. São João, ao encerrar o prólogo, afirma que, “não é, alias, meu principal intento dirigir-me a todos”, pois algumas “já se acham desapegados das coisas do mundo, compreenderão melhor a doutrina da desnudez do espírito”.
Portanto, trilhar ou criar novos caminhos, novas subidas ao monte é ter perante os olhos a união com Deus, encontro com a verdade renovando o modo de subir o monte e enfrentar a noite escura. Renunciando a si mesmo e tomando a cruz de cada dia para seguir a Cristo.
No momento em que os santos conheceram a Cristo ficaram conscientes deste conhecer a verdade. São João da Cruz ao subir o monte ficou consciente da plena verdade que transformou sua vida através do encontro com o Amado.
Ter consciência é perceber que Cristo é a verdade, e isso implica em mudança de vida, em transfiguração. A partir daí nosso rosto resplandecerá como o sol, nossas vestes se tornaram brancas como a luz (Cf. Mt 17,2). Comumente temos a noção, conhecemos superficialmente, que Cristo é a verdade. No entanto, pode não existir consciência, logo não existe intimidade entre Cristo e a pessoa.

Rodrigo Souza de Souza

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